Marco Aurélio diz que ‘jamais’ faria pacto entre Poderes, como Toffoli

Ministro avalia que objetivos do presidente do STF ‘às vezes não se coadunam com atuação do Supremo’ e relata que ele não falou com colegas sobre o assunto

Não foi bem recebida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello a participação do presidente do STF, ministro Dias Toffoli, no café da manhã em que ele tratou com Jair Bolsonaro e os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP), sobre um pacto entre os três Poderes a favor das reformas e do crescimento.

Presidente da Corte entre 2001 e 2003 e segundo ministro mais antigo no plenário do STF, Marco Aurélio disse a VEJA que “jamais” sequer participaria de um encontro com este objetivo. Toffoli, por sua vez, é conhecido por ser dono de um perfil mais negociador.

“Ele [Toffoli] quer realizar muita coisa e, às vezes, o objetivo não se coaduna com a atuação do Supremo. No passado, com a velha guarda que encontrei quando cheguei ao tribunal, em 1990, seria impensável cogitar-se de um pacto dessa natureza. Eu, como presidente do Supremo que fui, não iria a um encontro desses, com esse objetivo, jamais”, declarou.

Para o ministro, “sem dúvida alguma” o pacto deveria se restringir aos Poderes Executivo e Legislativo. “O Judiciário, como ele julga inclusive leis editadas, deve manter uma certa cerimônia”, avalia. Ele pondera que “cada um tem seu estilo de atuar”, mas pontua que “pacto no campo administrativo é uma coisa, no jurisdicional é impensável. Em termos de julgamento é impensável falar-se em pacto”.

Ele citou o julgamento no plenário do STF nesta quarta, que derrubou ponto da reforma trabalhista sobre o trabalho de grávidas e lactantes em ambientes insalubres, para lembrar que partes da reforma da Previdência também podem ter a constitucionalidade analisada pelo Supremo.

Marco Aurélio Mello relata que Dias Toffoli não tratou com os demais ministros do STF sobre a pauta do encontro com Bolsonaro, Maia e Alcolumbre, nem foi perguntado sobre o assunto. “Não conversou, não disse do que tratou, do que não tratou, qual foi o café da manhã”, ironizou.

Marco Aurélio ressalta ainda que a intenção de fazer parte do pacto não inclui os membros da Corte. “Colegiado é colegiado, é a somatória de forças distintas. Temos uma cadeira vitalícia para atuar com absoluta independência”, disse o ministro a VEJA.

Em fevereiro, partiu do próprio Dias Toffoli a ideia de um “novo grande pacto entre os três Poderes”, agora proposto pelo presidente Jair Bolsonaro.

Na sessão solene no Congresso na abertura dos trabalhos legislativos deste ano, o presidente do Supremo declarou: “venho propondo a celebração de um novo grande pacto entre os três Poderes da República, que envolva reformas fundamentais, como a previdenciária e a fiscal/tributária, e compreenda, necessariamente, uma repactuação federativa, evitando que estados e municípios cheguem a um quadro insustentável de inadimplência”.

Após o café da manhã no Palácio da Alvorada, nesta terça-feira, 28, o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, anunciou que o documento com um conjunto de metas e ações pode ser assinado pelos presidentes dos Poderes na semana do dia 10 de junho.

Associação de juízes critica pacto

Assim como Marco Aurélio Mello, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) também criticou nesta quarta-feira a participação do presidente do STF no pacto com o presidente da República e os das Casas do Legislativo. A Ajufe citou “preocupação” com “a concordância do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) à Reforma da Previdência”.

“Sendo o STF o guardião da Constituição, dos direitos e garantias fundamentais e da democracia, é possível que alguns temas da Reforma da Previdência tenham sua constitucionalidade submetida ao julgamento perante a Corte máxima do país”, diz nota da Ajufe, assinada por Fernando Mendes, presidente da associação.

Para a Ajufe, a possibilidade de trechos do texto sobre as mudanças nas aposentadorias serem analisados pelo Supremo “revela que não se deve assumir publicamente compromissos com uma reforma de tal porte, em respeito à independência e resguardando a imparcialidade do Poder Judiciário, cabendo a realização de tais pactos, dentro de um estado democrático, apenas aos atores políticos dos Poderes Executivo e Legislativo”.

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Fonte VEJA
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