Luiz Gomes: ‘Será que Zico, Rivelino e Petkovic resolveriam o problema dos gols de falta no Brasil?’

No calendário selvagem do futebol tupiniquim, cada vez menos há tempo para treinar

O dia era 27 de maio de 2001, final do Campeonato Carioca. A torcida do Vasco já comemorava o título quando, aos 43 minutos do segundo tempo, Edílson, o Capetinha, sofreu falta na intermediária, no lado direito do ataque do Flamengo. Dejan Petkovic pegou a bola, tomou distância – não tão longa assim – e, ao ouvir o apito do árbitro, bateu colocado, preciso, no ângulo do goleiro Helton. Extasiado, Pet caiu de costas, com os braços abertos no gramado. A festa na arquibancada mudou de lado. Flamengo campeão.

Não há quem não se lembre desse gol, não é mesmo? Foi um dos 15 de falta que Pet marcou apenas pelo Flamengo – sem falar em 14 de pênalti e quatro olímpicos – nos 196 jogos que disputou com a camisa rubro-negra. Foram outros tantos da mesma forma nos outros tantos clubes pelos quais passou na carreira, no Brasil e lá fora.

Vinte anos depois, o Flamengo de Pet amarga um jejum de 950 dias sem marcar um único gol de falta. Uma situação inteiramente atípica num time que, além do meia sérvio, se acostumou a ter batedores com o talento de Junior, Marcelinho e o maior de todos, Zico, um mestre nas bolas paradas.

Mas o Flamengo não é o único a passar por isso. Levantamento do blog “Espião Estatístico”, no site “GE”, mostra que em 2020 o Brasileirão teve apenas 10 gols em cobranças de falta. Esse tipo de lance sofreu uma redução impressionante de 78% nos últimos 10 anos. Clubes como o Corinthians com 884 dias, o Ceará com 664 e o Palmeiras com 604 estão entre os que mais sofrem com a seca.

Mas será que os jogadores brasileiros perderam o dom das cobranças perfeitas? A arte cultivada por craques como Alex, Rivelino, Nelinho, Edu e tantos outros virou coisa do passado?

 

Não se trata disso. Talento é essencial, nato, mas é o treinamento, a repetição, a insistência, que fazem a história dos grandes batedores. Zico era conhecido por ficar em campo, encerrados os treinos na Gávea, horas a fio só para bater faltas. Messi e Cristiano Ronaldo, os maiores deste século, fazem o mesmo, um no Barcelona, outro no Real e agora na Juventus, Independentemente de há muito tempo já não terem de provar mais nada a ninguém.

O problema das faltas que não se transformam em gols por aqui é o mesmo de outros fundamentos do jogo que vão perdendo qualidade. No calendário selvagem do futebol tupiniquim, cada vez menos há tempo para treinar. Ainda mais para treinar depois do treino. Cruzamentos, cabeçadas, cobranças de pênalti, lançamentos, tudo isso entra no mesmo pacote.

Só para ilustrar, o Palmeiras está mergulhado em uma maratona de 14 jogos em pouco mais de um mês com o Brasileirão e as finais da Libertadores e da Copa do Brasil. Já o Atlético-MG, mesmo disputando uma única competição, terá outros sete jogos em 21 dias, por conta de mudanças na tabela. E não venham culpar a pandemia, nada foi muito diferente nos últimos anos. É a dura rotina a que os clubes e os jogadores estão submetidos no país que insiste em se manter como a vanguarda do atraso no mundo da bola.

Convenhamos, pois nem o Galinho teria energia para ficar ali chutando bola no gol em busca da excelência com tamanho excesso de jogos. Essa é a conta, simples assim!

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