Árvore mais alta da Amazônia está 50% maior – e cientistas não sabem por quê

Pesquisadores explicam como encontraram essa gigante na floresta

Às vezes, mesmo as maravilhas naturais mais impressionantes podem permanecer escondidas dos humanos por séculos. A Amazônia é um lugar denso, cheio de vida, com novas espécies de flora e fauna sendo descobertas volta e meia. Agora, usando a mesma tecnologia que leva carros sem motorista de A a B, nós — liderados por Eric Gorgens e Diego Armando da Silva, juntamente com colegas do Brasil, Swansea, Oxford e Cambridge — descobrimos a árvore mais alta da floresta tropical.

Com 88 metros de altura, a árvore mais alta supera em quase 30 metros recordes anteriores das maiores árvores da região. O Escudo das Guianas, planalto localizado no nordeste da Amazônia e responsável por quase 9% das florestas tropicais remanescentes do mundo, pode conter muitas árvores gigantescas — cada uma é capaz de armazenar tanto carbono quanto um hectare de floresta tropical. Nossa descoberta significa que a vasta floresta pode ser um sumidouro de carbono maior do que se pensava anteriormente.

Não tropeçamos nessas árvores enquanto passeávamos na floresta. Entre 2016 e 2018, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais do Brasil (Inpe) coordenou um projeto para escanear a laser grandes partes da Amazônia. Foram digitalizadas 850 áreas de floresta distribuídas aleatoriamente, cada uma com 12 km de comprimento e 300 metros de largura. Sete desses trechos continham evidências de árvores com mais de 80 metros de altura; a maioria estava localizada ao redor do Rio Jari, um afluente norte do Amazonas.

Ficamos surpresos com as alturas das árvores, então partimos em uma viagem para confirmar as descobertas com nossos próprios olhos, determinar suas espécies e, é claro, escalá-las.

A jornada
Partimos de barco de Laranjal do Jari, no Amapá, em um calor úmido de 35 graus. Fomos até a vila de São Francisco do Iratapuru, uma comunidade que produz castanha-do-pará de forma sustentável. A comunidade nos forneceu quatro barcos e 12 pessoas nos guiaram pelo rio e pela densa e inesquecível floresta.

Sem a assistência de especialistas, não teríamos resolvido os obstáculos que se seguiram. O primeiro foi a Cachoeira de Itacará: levamos o segundo dia inteiro para transportar os pesados ​​barcos de madeira e todo o nosso equipamento por terra, coberta com vegetação densa.

Depois de Itacará, o Rio Jari variou entre 30 e 300 metros de largura e, em alguns momentos, era sereno; em outros, era cheio de rochas e corredeiras. Ficamos aliviados ao ver que alguém havia embalado muitas hélices sobressalentes para os motores — no final da viagem, tínhamos usado cada uma delas. A certa altura, nossa hélice atingiu uma rocha submersa e quebrou, deixando-nos sem poder ou direção, exatamente quando estávamos tentando forçar o nosso caminho rio acima através de uma sequência de corredeiras.

Atravessamos a Linha do Equador no terceiro dia e percorremos 70 km. No dia seguinte, passamos a maior parte do tempo dentro do rio, com a água até a cintura, transportando os barcos por oito quilômetros de corredeiras e rochas com cordas e com nossas mãos.

Mapa da jornada pela Amazônia que os pesquisadores britânicos Tobias Jackson e Sami Rifai realizaram (Foto: Eric Gorgens, Author provided)

Depois de percorrer 240 km no total, finalmente chegamos ao acampamento no sexto dia. Muitas das árvores altas ficavam bem perto do rio. Embora pudéssemos visitá-las facilmente, cortar a densa vegetação do chão era um trabalho tão difícil que não tivemos tempo de visitar todos os locais revelados pelo laser.

Passamos os dias seguintes coletando amostras e medindo as árvores. Encontramos pelo menos 15 árvores gigantes, todas com mais de 70 metros de altura e algumas superando 80 metros. Surpreendentemente, todas eram da mesma espécie: Angelim vermelho (Dinizia excelsa), comum na Amazônia, de madeira forte e fedorenta. Anteriormente, pensava-se que crescia apenas 60 metros.

Ainda não sabemos como essas árvores conseguiram crescer mais. Como espécies pioneiras – as primeiras a crescer em novas áreas ou em lacunas na vegetação –, é possível que tenham se aproveitado de alguns distúrbios que devastaram parte da floresta, talvez causados ​​por tempestades ou habitação humana. O fato de terem sobrevivido por tanto tempo e crescido tão alto deve ser graças ao seu distanciamento absoluto das áreas urbanas e de indústrias.

Colosso de carbono
A tecnologia de escaneamento a laser que permitiu as descobertas das árvores gigantescas não é brinquedo. Permite que os cientistas mapeiem a estrutura da floresta e o armazenamento de carbono com detalhes e em escalas sem precedentes. Assim eles avaliam melhor sua importância no ciclo global do carbono. Vários projetos estão coletando dados, o que nos permitirá monitorar a mudança da saúde em florestas.

Nossa pesquisa sugere que o nordeste da Amazônia poderia armazenar mais carbono do que se pensava anteriormente. Cada Angelim vermelho pode armazenar até 40 toneladas de carbono; isso é o equivalente de 300 a 500 árvores menores. Embora tenhamos visitado apenas 15 árvores, essa foi uma pequena proporção das árvores reveladas pelos do laser. Portanto, é provável que haja mais árvores gigantes por aí. Algumas podem ser ainda mais altas que a recordista de 88 metros de altura.

No atual cenário político, há muitas razões para se preocupar com a Amazônia. O fato de que descobertas como essas ainda são feitas, mesmo enquanto partes da floresta são destruídas pela exploração madeireira, queima e expansão agrícola, demonstra o quanto ainda resta a aprender sobre esse incrível e misterioso ecossistema.

Infelizmente, é provável que muitas espécies desconhecidas na Amazônia sejam extintas antes mesmo de as descobrirmos. Devemos fazer todo o possível para proteger esta majestosa floresta tropical e seus tesouros, conhecidos e não descobertos.

* Tobias Jackson é pesquisador de pós-doutorado em ecologia e conservação florestal na Universidade de Cambridge; Sami Rifai estuda modelagem de ecossistemas e dados climáticos na Universidade de Oxford. Este artigo foi escrito em inglês e originalmente publicado no site The Conversation

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